Como lidar com casos psiquiátricos refratários?
Avanços na farmacoterapia têm tido um notável impacto no curso e no resultado de transtornos psiquiátricos. No entanto, os estudos demonstram consistentemente que uma significativa proporção de pacientes (15-30%) que recebem tratamentos farmacológicos atinge melhora mínima ou nenhuma melhora, mantendo sintomas residuais de incômodos a incapacitantes¹.
O desenvolvimento de novos tratamentos psiquiátricos não farmacológicos nas últimas décadas renovou o interesse em terapias somáticas¹.
Alguns tratamentos que têm despontado no uso clínico são a estimulação magnética transcraniana (EMT/TMS), a estimulação transcraniana com corrente contínua (ETCC/tDCS), a estimulação do nervo vago e a estimulação transcraniana com corrente alternada (TACS), na modalidade de estimulação do nervo trigêmeo (TNS).
Especial destaque tem a eletroconvulsoterapia (ECT), com vasto material técnico-científico acumulado em quase 80 anos de prática, que confirma sua eficácia e segurança no tratamento de transtornos mentais refratários¹.
Em termos técnicos, muita coisa mudou desde seus primeiros usos (e abusos) no início do século XX. A ECT moderna é realizada com aparelhos que permitem regular precisamente o estímulo, utilizando onda quadrada e pulos breves e ultrabreves. É mandatória sua aplicação em ambiente hospitalar, com monitorização, acompanhamento por médico anestesiologista e psiquiatra. A anestesia é geral e inclui uso de relaxantes musculares para maior conforto e segurança.
Vale lembrar que desde 2002 o Conselho Federal de Medicina regulamentou a técnica, sendo a normativa atual a portaria CFM 2057/2013. Também há diretrizes clínicas nacionais da ABP/AMB. Diversos países utilizam a ECT na sua rotina e têm guidelines para orientação, como o Reino Unido, Canadá, Alemanha, EUA e Austrália.
Apesar de estratégias farmacológicas continuarem representando a promessa de uma abordagem mais segura e mais eficaz para o tratamento psiquiátrico, é necessário pensar em alternativas para mitigar o sofrimento¹.
Em casos refratários pode-se exercitar a habilidade de repensar o problema, mudar o sistema conceitual e encontrar novas formas de ação que podem, teoricamente, aumentar a probabilidade de um resultado efetivo². Em casos de transtorno de humor, a taxa de resposta à ECT pode chegar a 80-90%. O efeito colateral mais temido – a perda de memória – é bastante discreto com as técnicas modernas, podendo,inclusive, não ocorrer. Fato é, a maioria dos pacientes encaminhados para ECT percorrem um caminho desnecessariamente sofrido e longo antes que algum profissional lhe apresente esta alternativa.
Além das terapias somáticas, outra estratégia a ser associado ao tratamento psiquiátrico de casos refratários é o tratamento em psicoterapia, que pode ser extremamente útil na abordagem de casos de depressão de difícil tratamento.
O médico guia, orienta. Mas o paciente, antes de mais nada, é quem sinaliza aquilo que faz sentido e mede, com a régua do seu sofrimento, o risco que aceita correr.
Está precisando de ajuda com um paciente refratário? Entre em contato conosco para indicar um paciente
---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
1. BRAGA, Raphael J.; PETRIDES, Georgios. Terapias somáticas para transtornos psiquiátricos resistentes ao tratamento Somatic therapies for treatment-resistant psychiatric disorders. Rev Bras Psiquiatr, v. 29, n. Supl II, p. S77-84, 2007.
2. TREVISAN, Júlia. Psicoterapia psicanalítica e depressão de difícil tratamento: à procura de um modelo integrador. Revista de Psiquiatria, v. 26, n. 3, p. 319-328, 2004
3. Diretrizes para Eletroconvulsoterapia (AMB/ABP) - https://diretrizes.amb.org.br/psiquiatria/eletroconvulsoterapia-2/
4. Guideline de ECT – British Columbia: https://www.health.gov.bc.ca/library/publications/year/2002/MHA_ect_guidelines.pdf
5. Pedro Shiozawa, Mailu Enokibara da Silva, Rafael Bernardon Ribeiro, Rodrigo Lancelote Alberto, Quirino Cordeiro. Neuromodulação em Psiquiatria. Atheneu, 2016.